quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Texto-denúncia: o amor está mantido em cárcere privado.

Coração inundado de amor e não temo que se apaixones por outrem. É que coração é terra sem fim onde cabe toda gente que se queira deixar andar. Saiba, meu bem, caso te aconteça de amar mais alguém, desejo que ame o quanto possas, ame sem cessar. Que loucura seria a tua reter em ti amor desperto.

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Pouco a pouco, tenho entendido melhor isto de amar assim sem medo de qualquer outra coisa que não seja perder teu amor por mim. Coisa que só se perde ao esquecimento. É que chama ou arde ou finda; outro risco não há. Não tenho dó de amor que muda, se transmuta. Eu tenho dó de amor que finda.

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Digo a toda gente: se tu amas alguém a quem amo, não, nós não somos rivais. Mas cúmplices da existência mágica, encantadora e apaixonante de um dado ser. Amemos mais. Por favor, deixemos transbordar o amor.

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Ciume é coisa inventada. Mal da cultura. Desamor. Como posso ter medo do que não passa por mim, não me tange, não me toca, não me diz respeito? É meu sim o seu amor por mim. É meu o afeto que me ofertas e só. Disto posso cuidar. A isto posso me ater. Com isto posso me ocupar. Por isto posso agradecer.

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Ninguém, além da gente, ameaça o amor que transita e flui entre nós.

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O mundo está introjetado em mim. Há muito trabalho a ser feito na busca por reinventar o ser-mundo que sou. A estrada é longa, mas como não sou capaz de permanecer aqui, sigo caminho. E busco realinhar-me ao direito de amar livremente. São muitas as amarras e há que se ter zelo no ato contínuo de desatar os nós do percurso de reinventar-me inteiramente entregue ao gozo de amar.

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Ciume é faca que nos rasga da pele pra dentro. Mesmo doído, não passa de hábito adquirido e sutilmente transmitido entre nós. Ciume é enredo prescrito, mas não intrínseco ao viver. É coisa inventada, um mal da cultura, desamor. Talvez não saibas, mas o ciume que sentes não é teu, preciso dizer, preciso alertar.

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Todo sujeito em estado de ciume é, nada mais que um obediente aos regimentos da cultura vigente no que tange ao cultivo permitido do amor. O amor está submetido a um duro controle. Mas a este mundo não interessa dizimá-lo. Interessa, em seu lugar, minar, restringir, impedir quase que completamente. Permití-lo, desde que, frágil, fraco, inseguro, vulnerável; amor feito mazela, amor doente.

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Há um deliberado boicote ao amor. Nossos modos previsíveis de experienciá-lo nos contam sobre isto. O amor está retido, reduzido, limitado, cerceado, restrito. Amar simplesmente está terminantemente proibido. Permitido está apenas amar um só alguém do sexo oposto, profissionalmente "bem sucedido", que queira ter filhos, habitar mesma casa, seja de mesma etnia ou raça e faixa etária. Só a exceção está liberada. Esta que de tão propagada fez-se regra torta, estranha, malvada. Desinventaram o amor quando lhe tolheram o desejo. Deixaram-no apático. E, por tantas vezes, quando pensamos amar, vegetamos amor.

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É que sou aquariana com vênus em sagitário. Não sei amar de outro jeito. Meu modo de amar tem que ser mais que aventureiro: político-libertário.

Feito sede, fome, sono que dá.

Mundo enreda gente. E foi assim, enredada por ele, que descobri que, no meu mundo, mundo não há. Há tantos mundos quanto seres que são parte deles. Hoje sei que houve tempo em que teve gente que inventou que há um mundo e este criou-se danado pra enredar a gente. Só que, dia desses, acordei na crença do desinventar. Enquanto o mundo é limite, os mundos são infinitude, imensidão. Coisa de olhar, jeito de ver o viver. Entendimento que vem como urgência. Feito sede, fome, sono que dá. Sabedoria que volta a se iluminar em mim. Porque, antes de ser gente, eu sabia que era assim: tudo potência. Vastidão. No meu mundo, tem mundo não. Tem mundos e mundos sem fim.